Artigos Técnicos

Bem-estar dos animais de interesse pecuário

 

1. Introdução

O aumento da população humana e a correspondente necessidade de produtos de origem animal, continuam a aumentar a níveis sem precedentes. O consequente aumento da produção animal levanta uma série de questões éticas, incluindo a sustentabilidade ambiental e o acesso seguro aos alimentos, que devem ser considerados conjuntamente com a crescente preocupação com o bem-estar animal.

O bem-estar animal engloba um vasto conjunto de conceitos e princípios gerais, normas legislativas comunitárias e mudanças nos sistemas de produção pecuária intensiva ao nível da União Europeia (UE). O bem-estar de um animal pode ser definido como o seu estado, no que se refere às tentativas de lidar com o ambiente que o rodeia. Isto inclui o seu estado de saúde, condição física, fisiológico e estado emocional. A apreciação do bem-estar como sadio ou débil pode ser avaliado utilizando uma grande variedade de medidas. Embora uma única medida permite indicar se o bem-estar é pobre, estudos comparando bem-estar em diferentes sistemas, ou utilizando diferentes métodos de produção pecuária, deverão basear-se num conjunto de indicadores (FAWC, 1993). Existe uma ampla abordagem do bem-estar proporcionada pelo princípio das “cinco liberdades”. Liberdade de fome e sede, desconforto, dor, lesão ou doença, medo e angústia, a liberdade de expressar um comportamento normal. As cinco liberdades não descrevem os critérios a respeitar em qualquer tipo de sistema de estabulação e maneio animal para atingir um nível aceitável de bem-estar. Pelo contrário, as cinco liberdades indicam uma forma de identificar os problemas e a direção a seguir para melhorar a assistência aos animais (Webster, 2001; Rushen et al., 2008). Desde a mais antiga tradição de cuidar dos animais, que o bem-estar animal é visto em grande parte, pela ausência de dor, doença ou lesão e focando a atenção sobre a proteção individual dos animais, sobretudo garantindo que animais doentes recebem tratamento atempado e eficaz. O mais recente interesse do bem-estar animal nas explorações, no entanto, decorre da preocupação da sociedade civil sobre algumas técnicas de exploração pecuária moderna, especialmente na pecuária intensiva (Rushen et al., 2008). Variáveis como taxa de crescimento, a sobrevivência e a incidência de doenças infeciosas em geral podem ser classificadas de forma objetiva, com forte concordância entre diferentes observadores, e aos investigadores em bem-estar animal tem sido recomendado o uso de tais medidas objetivas, sempre que possível (Fraser, 2003).

Governos de muitos países europeus responderam às preocupações públicas sobre bem-estar animal, através da aprovação de legislação que sanciona determinadas práticas, servindo também de base para criação de legislação no âmbito da UE. A Convenção Europeia para a proteção dos animais nas explorações pecuárias de 1978 incidiu sobre a importância de evitar sofrimento, garantir abrigo, nutrição e sistemas de maneio adequados aos animais.

 

A UE, com 27 países membros, também desenvolve políticas e padrões mínimos para o bem-estar e a proteção dos animais há aproximadamente 30 anos. Desde a década de 1980 um grande número de “regulamentos” e “diretivas” (acordos que os países membros são obrigados a traduzir para a legislação nacional) definiram padrões mínimos para o transporte e abate dos animais, bem como aspectos do ambiente de produção, como a criação de um espaço físico adequado em sistemas de produção confinados. O Protocolo sobre proteção e bem-estar dos animais da UE, anexo ao tratado de Amsterdão (que altera o tratado da União Europeia), reconhece os animais como “seres sensientes” e pede aos estados membros para “prestar atenção às exigências do bem-estar dos animais, respeitando as disposições legislativas ou administrativas e aduaneiras dos estados membros, em particular, os rituais religiosos, tradições culturais e património regional”.

 

2. Autoridade Europeia de Segurança Alimentar (AESA)

A Autoridade Europeia de Segurança Alimentar (AESA), foi criada em janeiro de 2002, após uma série de crises alimentares, que surgiram em finais dos anos noventa, na perspetiva de criar uma fonte independente de aconselhamento científico e de comunicação sobre os riscos associados à cadeia alimentar. Foi também uma das principais medidas, que emergiu, na sequência da publicação do Livro Branco sobre a segurança dos alimentos da Comissão Europeia, publicado em janeiro de 2000. A Autoridade é uma agência europeia independente, financiada pelo orçamento da UE que opera separadamente da Comissão Europeia, do Parlamento Europeu e dos Estados-Membros da UE, com personalidade jurídica própria. Tem como principal objetivo a emissão de pareceres científicos independentes sobre todas as matérias com impacto direto ou indireto na proteção dos animais e na segurança alimentar.

O trabalho da AESA abrange todas as etapas da produção e do aprovisionamento alimentar, desde a produção primária até à distribuição de alimentos aos consumidores, passando ainda pela segurança dos alimentos para animais. Recolhe informações e analisa os novos avanços científicos, de modo a identificar e avaliar todos os eventuais riscos para a cadeia alimentar. Pode proceder a avaliações científicas de qualquer matéria suscetível de ter um impacto direto ou indireto na segurança do aprovisionamento de alimentos, incluindo aspetos relacionados com a sanidade animal, com o bem-estar dos animais e com a fitossanidade.

Além do aconselhamento científico independente e de um trabalho fundamental de apoio à Comissão Europeia na implementação de medidas legislativas para as políticas de segurança alimentar da UE, tem-se debruçado sobre a elaboração de pareceres independentes, no que se refere aos riscos associados à alimentação humana e animal, fitossanidade, ambiente, saúde animal e bem-estar animal, utilizando sempre que possível, uma avaliação de risco.

 

Compete à AESA contribuir para o desenvolvimento de normas, realizar a avaliação dos riscos de bem-estar animal e promover medidas baseadas nos resultados obtidos, para ultrapassar os problemas mais prementes. O painel de peritos da área de Saúde e Bem-Estar Animal da AESA emitiu 42 pareceres científicos sobre bem-estar animal, entre 2004 e 2012, para diferentes espécies animais de interesse pecuário e da vida selvagem. O Painel de Saúde e Bem-estar Animal da AESA é responsável por todos os aspetos de saúde e bem-estar animal, relacionados principalmente com animais de produção na sua relação homem-animal-ambiente. Os protocolos de avaliação de bem-estar utilizados em trabalho de campo devem abranger os principais riscos identificados em pareceres científicos da AESA. A AESA também emite pareceres científicos sobre organismos geneticamente modificados (OGM) não destinados à alimentação humana nem animal e sobre nutrição no contexto da legislação comunitária.

 

3. Bem-estar animal e legislação

A primeira legislação no domínio do bem-estar animal ao nível da UE foi adotada em 1974 e dizia respeito à proteção dos animais na altura do abate. Desde então, a legislação comunitária neste domínio não deixou de aumentar. No que se refere aos animais nas explorações pecuárias, a legislação elaborada até à data fixa essencialmente regras mínimas para a sua proteção. Estão fixadas regras mais pormenorizadas apenas para a criação de algumas espécies animais (vitelos, suínos, frangos e galinhas poedeiras), enquanto outras, como os bovinos de carne, as vacas leiteiras, os pequenos ruminantes, os perus, os patos, e demais espécies animais, apenas são abrangidas por requisitos gerais.

O bem-estar animal é considerado um elemento integrante da qualidade dos alimentos e tem impacto na saúde animal e na segurança alimentar. Nos últimos anos com a valorização do bem-estar animal, surgiram para algumas espécies animais, regras mais restritivas nos alojamentos dos animais (principalmente relacionadas com a densidade animal, com os pisos, com as divisórias, com as gaiolas e a na socialização dos animais). A UE através da legislação publicada, introduziu alterações importantes na grande maioria das instalações existentes, construídas de acordo com a legislação anterior, no sentido de salvaguardar a proteção e bem-estar dos animais. Por outro lado as cadeias de distribuição também exigem melhorias nos sistemas de produção, pois os consumidores também são cada vez mais sensíveis às questões de bem-estar animal e segurança alimentar, valorizando estas novas formas de produção, exigindo do tecido produtor a atualização dos seus métodos de trabalho e adaptação à legislação e regulamentos publicados. Em janeiro de 2012, a Comissão Europeia publicou uma nova estratégia para a proteção e bem-estar dos animais para o período 2012-2015, que visa reforçar algumas das medidas existentes, apresentadas anteriormente como parte do plano de ação 2006-2010, mas sobretudo promover uma abordagem mais abrangente com vista a melhorar as condições do bem-estar animal na UE. Os Estados-membros são responsáveis por garantir que os requisitos de bem-estar são cumpridos na UE de acordo com a legislação em vigor.

Ao nível comunitário e nacional, existe um vasto leque de legislação na área do bem-estar animal, que abrange a produção primária (explorações pecuárias), normas de transporte e abate dos animais. A Diretiva 98/58, de 20 de julho, transposta para o direito nacional através do Decreto-lei nº 64/2000, de 22 de abril, determina os requisitos mínimos dos animais nos locais de criação, aplicando-se na generalidade a todas as explorações pecuárias, independentemente da espécie animal em causa. Neste Decreto-lei, encontram-se definidos os requisitos das explorações, nomeadamente as obrigações dos detentores, a competência dos tratadores, as condições de alimentação, instalações e alojamento, equipamentos, liberdade de movimentos, o tipo de registo obrigatório, as condições ao ar livre e o tipo de mutilações autorizadas. Atualmente existe legislação específica que define os requisitos, em matéria de bem-estar animal, das explorações das galinhas poedeiras, frangos, suínos e vitelos, assim como no transporte e abate (Quadro 1).

 

Quadro 1. Legislação de bem-estar animal na produção, transporte e abate

Legislação

Âmbito

Principais diretivas

Decreto-lei nº 64/2000, de 22 de abril

Explorações pecuárias

Obrigações dos detentores, requisitos em matéria de alimentação, liberdade de movimentos, registos, instalações e alojamento, equipamentos, condições ao ar livre e mutilações

Decreto-lei nº 48/2011, de 10 de fevereiro

Explorações de vitelos (até 6 meses)

Condições de alojamento, acomodação e cuidados a ter com os animais

Decreto-lei nº 72-F/03, de 14 de abril

Explorações de galinhas poedeiras com mais de 350 aves

Proibição de utilização de gaiolas não

Melhoradas e requisitos dos sistemas alternativos e das gaiolas melhoradas

Decreto-lei nº 79/2010, de 25 de junho

Explorações intensivas de frangos com mais de 500 animais

Sistema de avaliação do Bem-Estar dos frangos no matadouro, requisitos dos alojamentos, maneio e densidade animal

Decreto-lei nº 135/2003, de 28 de junho

Explorações de suínos

Condições de alojamento e maneio dos animais, alojamento de porcas em grupo, dimensões dos parques, pavimentos e materiais manipuláveis.

Regulamento 1/2005, de 22/12/2004 e Decreto-Lei nº 265/07, de 24 de junho

Transporte de animais com fins comerciais

Autorização de transportador, condições

dos veículos, aptidão para o transporte, carga e descarga, espaços, tempos de viagem, formação dos condutores e

tratadores

Regulamento 1099/2009, de 24 de setembro

Abate dos animais

Formação dos operadores no matadouro, responsável pelo bem-estar animal, requisitos das instalações, atordoamento e sangria. Encaminhamento dos animais,

procedimentos operacionais normalizados

 

A legislação mais recente centrou-se na proteção das galinhas poedeiras e dos suínos, em sistemas de produção intensivos, em que os problemas de liberdade dos animais eram mais evidentes e causadores de estereótipos crónicos.

A Diretiva do Conselho 1999/74/CE sobre a proteção das galinhas poedeiras, que entrou em vigor a 1 de janeiro de 2012 em Portugal, define que os Estados-membros devem garantir que as gaiolas não melhoradas sejam substituídas por gaiolas melhoradas ou sistemas alternativos. As galinhas mantidas nos sistemas de gaiolas enriquecidas e nos sistemas sem gaiolas devem também dispor de um ninho, um espaço de poleiro de 15cm por galinha, cama que permita debicar e esgravatar e acesso livre a uma manjedoura de, pelo menos, 12cm por galinha na gaiola.

Outra novidade foi a implementação da Diretiva do Conselho 2001/88/CE que define as normas mínimas para a proteção de suínos e visa eliminar, em explorações pecuárias com mais de dez porcas, a utilização de celas individuais para porcas prenhes e marrãs durante o período que vai do fim da 4ª semana após a cobrição até uma semana antes da data prevista de parição e o uso de amarras, incluindo a melhoria da qualidade das superfícies do pavimento. Esta legislação vigora desde janeiro de 2013 em Portugal, tendo sido também definidos requisitos importantes para garantir um determinado nível de formação e competência no que toca a questões de bem-estar para os criadores e o pessoal encarregue dos animais.

 4. Indicadores de avaliação de bem-estar animal

De acordo com a estratégia definida para o bem-estar animal 2012-2015, existe um forte interesse em trabalhos orientados para a avaliação de indicadores de bem-estar animal ao nível da produção, transporte e abate, os quais possam refletir as diferentes realidades produtivas nacionais. O bem-estar animal nas explorações encontra-se no topo da agenda política e social de muitos países e existe uma pressão considerável para estabelecer regularmente programas de monitorização de bem-estar animal nas unidades produtivas.

A avaliação de bem-estar animal é um processo moroso e dispendioso e que tem levado tradicionalmente à sua realização através de bases de dados que são compiladas de uma forma rotineira pelos serviços oficiais. No entanto exige-se o acompanhamento dos animais e a avaliação de indicadores de bem-estar animal de forma permanente e sistematizada.

Estudos recentes mostram uma grande diversidade de resultados nos indicadores de bem-estar animal entre explorações, e por isso é premente dispor de instrumentos que permitam avaliar o bem-estar animal ao nível do efetivo.

Existem diversos sistemas de avaliação de BEA centrados nos princípios das “cinco liberdades” (FAWC, 1993; Welfare Quality, 2009; De Vries et al., 2011). Este método é universalmente aceite, no entanto a sua interpretação não é consensual e a aplicação de certas medidas pode ser considerada pouco realista. Existem outros modelos afins, tais como, os sistemas desenvolvidos na Áustria (índice de necessidades animais) (Bartussek et al., 2000) e na Alemanha, que incidem sobre as condições ambientais, densidade animal, caraterísticas das instalações, maneio e ainda programas de garantia de bem-estar animal (Leeb et al., 2004). São sistemas de avaliação do bem-estar animal que defendem como mais apropriados, os indicadores relacionados com o ambiente e os recursos disponíveis para os animais, que desencadeou inclusive, a publicação de legislação, que ao definir os critérios mínimos de condições para a manutenção de animais, considerava garantido o seu bem-estar.

O sistema Austríaco discrimina cinco condições essenciais de avaliação, de entre as quais se destaca o contacto social com os membros da mesma espécie, além da possibilidade de mobilidade, o tipo de piso, ambiente do estábulo (ventilação, luz e ruído) e a intensidade dos cuidados prestados pelos operadores (Bartussek, 1999). Outra motivação para o desenvolvimento de sistemas globais tem sido a necessidade da observância das normas de bem-estar animal. Estas têm motivado muitos estudos experimentais. Poucos métodos, contudo, têm sido desenvolvidos para a realização de uma avaliação global de bem-estar dos animais, em condições de campo nas explorações. Os sistemas Austríaco e Alemão, apesar de muito úteis, pois apenas com uma visita à exploração, permitem o registo de todos os fatores mais importantes, apresentam limitações.

Segundo Capdeville e Veissier (2001) as medidas diretas de saúde, comportamento entre outras feitas sobre os animais fornecem uma avaliação mais precisa do verdadeiro estado de bem-estar do que indicadores indiretos. Estes autores desenvolveram um protocolo de avaliação de bem-estar nas explorações baseado nas cinco liberdades, onde recomendam a realização de várias visitas à mesma exploração para uma recolha de dados mais completa e fiável. Por isso as medidas baseadas nos animais são cada vez mais recomendadas (Webster et al., 2004; EFSA, 2012). Com o desenvolvimento do projeto “Welfare Quality” (2004 a 2009), a nível mundial, também foi publicado um conjunto de manuais com protocolos de avaliação de bem-estar específicos para bovinos, suínos e aves, muito úteis para investigadores, técnicos e produtores. Inclusive a Autoridade Europeia de Segurança Alimentar reconheceu recentemente o interesse da utilização destes indicadores centrados no animal, como de grande importância para aferir sobre as condições de produção animal. Os estudos realizados evidenciam problemas de bem-estar animal, quer relativamente aos alojamentos, como ao maneio animal e também na esfera das competências dos agentes do setor. Estas repartem-se por três grandes áreas, que são as associadas às infra-estruturas físicas dos estábulos, às medidas baseadas no animal e à formação de produtores e técnicos na área do bem-estar animal.

Nos últimos anos tem havido um aumento da preocupação em bem-estar animal, especialmente em sistemas de produção intensivos. Diversos protocolos de avaliação de bem-estar animal foram desenvolvidos na Europa, com destaque para os sistemas de produção em regime confinado. Assim, a inclusão de medidas baseadas nos animais, recentemente veiculadas pelo relatório da EFSA (2012) é assumida no sentido de melhorar os sistemas de avaliação de bem-estar animal.

O bem-estar animal é cada vez mais reconhecido como um aspeto fundamental da imagem e da qualidade do produto, o que cria a necessidade de se aplicarem sistemas fiáveis para a sua monitorização nas explorações e de garantir condições de produção adequadas.

 

5. O bem-estar e a comercialização de produtos de origem animal

McInerney (2004) considera explicitamente o bem-estar animal como um conceito económico, associado a valores morais e éticos, à ciência animal e à etologia, e acentua a necessidade duma abordagem multidisciplinar integrada, que balize as inovações tecnológicas à luz de novos paradigmas científicos e bioéticos. Este autor desenvolve, à luz da teoria económica, um modelo teórico que evidencia o conflito entre bem-estar animal e produtividade nos sistemas de produção intensiva e possível complementaridade destes conceitos nos sistemas de produção extensivos e sistemas em modo de produção biológico,

realçando a divergência entre o nível de bem-estar animal socialmente desejável e o nível de bem-estar animal aceitável no âmbito da produção e transformação dos produtos. Tal divergência resulta da maioria dos consumidores não estar disposta a pagar mais por produtos produzidos sob elevados padrões de bem-estar, ou seja o valor atribuído ao bem-estar animal é baixo ou inexistente no momento da compra.

As preferências que muitos consumidores demonstram por produtos nacionais podem ser associadas a caraterísticas de bem-estar animal que poderão potencializar as escolhas por carne de bovino Portuguesa. Existem já, em Portugal e em toda a Europa, sistemas de certificação que incluem padrões de bem-estar animal e que se podem traduzir em maior benefício para os produtores. Um exemplo destes nichos é o caso da agricultura biológica e da carne DOP, que representam pequenos nichos de mercado, mas que ainda assim se têm mantido consistentes, representando oportunidades de mercado interessantes para os respetivos produtores e com valor considerável para a sustentabilidade das regiões onde são produzidas. Os consumidores portugueses parecem considerar as produções extensivas como promotoras de bem-estar animal. Consideram importante a permanência dos animais em pastoreio com baixas densidades animais, embora estas condições per si, possam não garantir o cumprimento dos requisitos de bem-estar mais adequados. Além disso, é visto como uma mais-valia a possibilidade de expressão do comportamento natural e dos animais se alimentarem de forma não artificial.

Um rótulo claro que identifique o nível de bem-estar animal aplicado, poderia representar um instrumento de comercialização eficaz, como o atualmente utilizado para a identificação de certos produtos agrícolas com atributos regionais específicos. Um tal sistema de classificação terá de ser baseado em indicadores científicos normalizados, bem reconhecidos quer na UE quer a nível internacional, e apoiados por estudos de investigação, de modo a facilitar a comercialização desses produtos.

 

6. Considerações finais

O grande desafio que se coloca à produção animal do século XXI passará por compatibilizar os interesses dos vários agentes económicos da cadeia alimentar, nomeadamente os benefícios da indústria animal (equipamentos, genética, fármacos, rações, entre outros fatores de produção), dos produtores (produtividade elevada, cumprimento dos direitos legais), da transformação e distribuição (margens de lucro compensadoras) e dos consumidores (qualidade dos produtos e segurança alimentar), com as necessidades biológicas dos animais devidamente asseguradas de forma a garantir estatuto sanitário e bem-estar animal.

 

7. Bibliografia

 

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  • Welfare Quality, 2009. Assessment protocol for cattle. Uppsala, Suécia.
  • Welfare Quality, 2013. Disponível em: www.welfarequality.net/ 

 

Joaquim Lima Cerqueira

Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Viana do Castelo (ESA-IPVC)

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Data de publicação: 30/03/2014 12:45